Levantamento exclusivo aponta que apenas 4,5% das pessoas LGBTQIA+ têm emprego. É o que mostra a segunda reportagem da série especial do J10, 'De toda cor'. De toda cor: 0,38% dos postos de trabalho no país são ocupados por pessoas trans, revela estudo
O Datafolha estima que 15,5 milhões de brasileiros pertençam a comunidade LGBTQIA+ no Brasil, o equivalente a 7% da população. Mas de acordo um levantamento feito em quase 300 empresas, com 1,5 milhão de trabalhadores, essa parcela ocupa apenas 4,5% dos postos de trabalho.
É o que revelou um estudo exclusivo divulgado no segundo episódio da série do J10, da GloboNews, 'De toda a cor'.
Quando se coloca uma lupa sobre as pessoas trans, a situação é ainda pior: não chega nem a 0,5% (0,38%).
“Quando eu estava no quarto período (da faculdade de Direito), fui a vinte escritórios procurando estágio e nenhum me deu emprego. Eu tranco o curso achando que o problema estava comigo”, contou Maite Schneider, cofundadora da plataforma TransEmpregos.
Cria de Realengo, Zona Oeste do Rio, Rafaela Pinah passou por inúmeras profissões até se formar em moda e abrir a própria empresa. Hoje, é diretora criativa, stylist, curadora, produtora e tem um escritório de pesquisa etnográfica, que busca tendências e movimentos populares, principalmente dentro da favela.
“Me coloco num lugar de uma potência, muito verdadeira, muito lúdica. Contar um brasil do avesso, que as pessoas querem colocar na cozinha. E eu estar na sala de estar, disputando esse lugar de primeira pessoa, acho que é um fortalecimento pro mundo, para muitas que são iguais a mim”, conta Rafaela Pinah.
O artigo 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que toda pessoa tem direito ao emprego. Mas, na prática, o preconceito é uma grande barreira para as pessoas LGBTs. Não há números do mercado de trabalho de pessoas LGBTs. Assim como acontece com os casos de violência, são associações e entidades não governamentais que fazem levantamentos em meio a dificuldades de acesso à informação.
Sem números oficiais, fica difícil criar políticas públicas e, assim, a comunidade LGBT, principalmente as pessoas trans, continuam invisíveis.
Maitê Schneider, da TransEmpregos, é uma das entrevistadas da série 'De toda cor’, do Jornal das Dez
Andressa Gonçalves/GloboNews
Levantamento exclusivo
Pela primeira vez duas iniciativas focadas em diversidade se uniram. O Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+ reúne cerca de 200 empresas que assinaram uma carta de compromissos focada principalmente em empregabilidade LGBT.
A plataforma To.gather trabalha com dados para acelerar a diversidade nas empresas.
Cinquenta e uma empresas do fórum participaram de um levantamento exclusivo a pedido da GloboNews. Dessas, 61% empregam pessoas trans, atualmente. Cerca de 16% disseram que há pessoas trans em posições de liderança.
Mas na maioria delas, as vagas ocupadas por pessoas trans representam menos de 1% do quadro de funcionários.
“Eu uso uma expressão muito forte, porque parece um ‘terreno baldio’. Às vezes você vai olhar e fala assim, cadê os benefícios para pessoas LGBTI+ específicos? O que as pessoas LGBTI+ precisam? Você precisa fazer a primeira pesquisa, o primeiro levantamento”, disse Reinaldo Bulgarelli, secretário-executivo do Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+.
Em outro cenário ainda maior, e também exclusivo, a To.gather reuniu quase 300 empresas em 17 estados do país. Em um universo de cerca de 1,5 milhão de trabalhadores, apenas 4,5% são pessoas LGBTQIA+.
O número de trabalhadores trans não chega a 0,5% (0,38%).
“Por mais que às vezes as empresas comecem esse processo de fazer a coleta dentro de casa e fazer o movimento de uma forma mais natural, ainda tem que ser trabalhada a forma como as pessoas se sentem ao fornecer essa informação, que é outro obstáculo hoje”, comentou Erika Vaz, cofundadora e CEO da To.gather.
“A gente quer que as empresas tenham mais coragem de falar dos dados. A empresa precisa sair do armário. O estado, as políticas públicas, o governo, também precisa sair do armário”, completou Reinaldo.
Rafaela Pinah é uma das entrevistadas da série 'De toda cor’, do Jornal das Dez
Andressa Gonçalves/GloboNews
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Oportunidade
Há 11 anos, Maite Schneider, Márcia Rosa e a cartunista Laerte Coutinho começaram a desenhar um futuro para milhares de pessoas trans. Só no ano passado, 1.040 pessoas foram contratadas por meio da plataforma, que possui mais de 2.700 empresas e 30 mil currículos cadastrados.
“Na época, tínhamos na TransEmpregos pessoas com muitas competências que não entravam por falta de competência, mas porque eram pessoas trans. Eu dizia, não é uma sociedade meritocrática? Por que essas pessoas estão fora do mercado com tantas competências para além das pedidas nas vagas? A gente só vai ter empresas melhores, quando a gente tiver humanos melhores. Não adianta ter empresas com ótimos códigos de conduta, com políticas antidiscriminação, anti assédio, se as pessoas que compõem essas empresas nem respeitam aquelas leis.
O Ministério do Trabalho e Emprego reconhece a dificuldade em coletar dados.
“A captação desses dados passa pela autodeclaração. Se você não tem nos órgãos necessários ou nos documentos a identificação da orientação sexual ou identidade de gênero, a dificuldade é maior. Isso não significa que essa população está muito bem empregada, ao contrário. Sabemos de outros dados que essa população enfrenta um processo de exclusão no mundo do trabalho, principalmente as mulheres e homens trans. Essa não autodeclaração dificulta os dados”, comentou Anatalina Lourenço da Silva, chefe de assessoria de participação social e diversidade no Ministério do Trabalho e Emprego.
"A pergunta que eu faço para donos de empresas: será que nas vagas da tua empresa estão os melhores talentos mesmo? Será que seus filtros de seleção estão abertos para que os melhores talentos cheguem de verdade na tua empresa? Ou você está com aqueles que - entre aspas - convém através dos vieses que você estipulou dentro do teu processo?”, finaliza Maite Schneider.
Levantamento mostrou que pessoas trans são
Reprodução/GloboNews
Publicada por: RBSYS